sexta-feira, março 28, 2008

BAPTISMO EM MOÇAMBIQUE - (Parte IV)

POVOAÇÕES AUTÓCTONES

Quase cumpridos os objectivos cinegéticos, decidimos fazer uma pausa e visitámos uma praia no oceano Índico. Foram quatro horas de ida e outras tantas de volta. Vimos vários povoados míseros. Cabanas realizadas com folhas de palmeira ou com ladrilhos de adobe, circulares ou rectangulares, de uns 10 metros quadrados, com um pequeno pátio rondando os 6 metros quadrados. Não há água corrente, nem electricidade, nem saneamentos, nem latrinas. Nada de nada. Mulheres jovens com olhar triste, serenas e resignadas com várias crianças à sua volta, que saudavam sorridentes à nossa passagem. E sempre com alguma às costas, à maneira de mochila.
Passámos por uma plantação de coqueiros sob orientação de um português que, junto à sua mulher, nos convidou a tomar café. Contaram-nos que ali aguentaram toda a revolução e pensavam ficar para sempre. Os coqueiros dão até 12 colheitas por ano. Os naturais vivem disso, para além da mandioca e das batatas. Todos têm a malária.
No trajecto não nos cruzámos com qualquer veículo a motor. Só pessoas andando, uma ou outra bicicleta e um par de carros de bois. Vimos vários estudantes com uniforme que iam andando para a escola e mulheres com volumes à cabeça. Ao passar algumas ofereceram-nos pescado recém-capturado.

Na praia descascaram dois cocos tenros e bebemos a sua água. Estavam um pouco quentes, o que foi uma pena porque o sabor era uma delícia, muito diferente do que conhecemos aqui. Tomámos banho numa imensa praia, com areia branca e finíssima e água cristalina e quente.


FACOCERO

No dia seguinte, terça-feira, 13 de Setembro, saí com Ángel, na companhia de Walter, como caçador profissional, que não tinha nada que ver com Alain: - sério, alto e atlético, de uns 55 anos, cabelo curto com aspecto de operacional e grande conhecedor da sua profissão.
Ángel levava a sua Ruger 416 Rygby e com ela disparou e cobrou um magnífico cabrito do mato para a seguir, numa espécie de perseguição a grande velocidade pelo campo com vegetação muito alta, e após uma travagem, disparar sobre um Bush-pig, cobrando-o à segunda tentativa. Posteriormente caiu um bom facocero.
Almoçámos no acampamento e a tarde foi dedicada a recuperar o búfalo que Ángel tinha ferido no dia anterior. Fomos em coluna, Walter, Ángel, a mulher do profissional, dois batedores, um carregador e eu com a 375 H&H. Penetrámos numa zona de bosque, o mais silenciosamente possível, com uma imensa sensação de perigo já que o búfalo ferido podia estar a vigiar-nos.
Após várias horas abandonámos a busca, considerando-o por perdido. Dias depois, localizado pelos abutres, foi encontrado morto. Um bom troféu que Ángel acrescentará aos que já tem no seu pavilhão.

Regressámos à viatura e por volta das 17,30 horas, quando o sol se punha, na mata brava alta e a uns 100 metros, vimos um bom facocero. Só se via praticamente os seus grandes colmilhos. Encarei-o, dirigi a cruz para onde deveria estar o codilho e disparei, ali ficando sem necessidade de remate.
O facocero ou javali africano – warthog, está muito espalhado por toda a África sub-sariana. Encontram-se em grupos familiares de macho, fêmea e várias ninhadas, ainda que muitos dos velhos sejam solitários. Repousam durante as horas de calor, alimentando-se ao anoitecer. Dormem em esconderijos nos quais entram recuando para conseguirem defender-se. Habitualmente silenciosos, têm um ouvido e um olfacto muito apurados. É um troféu mais apreciado pelo caçador espanhol que pelo americano.
Nessa noite, depois do jantar, reunimos todo o pessoal do acampamento para lhes dar a regulamentar gratificação.

Pela tarde chegou a Barón, com um grupo de sul-africanos que iam caçar búfalos com arco. Às sete horas da manhã do dia seguinte iniciámos o regresso. Sobre a cabeça, os carregadores levaram o nosso equipamento até à avioneta. O terreno estava enlameado, mas descolámos sem problemas rumo à Beira. É uma cidade maior e com melhor aeroporto, ainda que com escasso tráfego.
Reiniciámos o voo até Polokwane para ajustar contas, e dali para Joanesburgo aonde partimos no Airbus 340, da Ibéria, chegando a Madrid às 6,50 horas.

Esta foi a história de um outonal baptismo em que actuaram, como padrinho o meu amigo Sr. Caçador de León, e como testemunhas os Srs. Catalán Doshijos e Román La Seca.
E assim acabou a minha primeira e emocionante experiência cinegética, da qual guardo uma recordação indelével.

Era sábado, 17 de Setembro.