sexta-feira, abril 13, 2007

MEMORIAL DE QUELIMANE: II - ZALALA, utopia renovada

A norte, onde Pebane porfia em ostentar paraísos que as dunas resguardam, sobressalta-se a vista e o pensamento eleva-se sob o brilho estelar, círio da linguagem nocturna dos batuques despertos.
Dialoga-se com o firmamento que galvaniza anseios de aventura e já salpicos de mar agigantam a ousadia para morder confins distantes.
Insaciável e competindo com índicas rebeldias, logo delira o espírito que célere navega na conquista de esplendores selvagens que, lá bem para sul, explodem em “tandos” de luxúria que o Zambeze fecunda.
De permeio sorve-se os bons sinais dos rios coleantes que eternizam presságios de rara beleza, e na fronteira de lânguidas casuarinas, onde o palmar soçobra, eis que Zalala emerge, imponente e irresistível, contagiando os sentidos que se libertam em dança.
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domingo, março 25, 2007

BOM-DIA PRIMAVERA

Todos os anos camélias e magnólias, entre outras espécies, maravilham os sentidos com a graciosidade de coloridas florações, prenunciando a Primavera.

No seu porte mais modesto, logo a seguir desperta a exótica “forsithia”, inundando os esguios braços de cativante amarelo.

Como que ignorando a precoce exibição daquelas, pacientemente o folhado aguarda o início da estação do crescimento para explodir a florescência, radiosa de alva frescura.

Hoje, redescubro-o neste recanto familiar e não resisto a confidenciar-lhe o meu apreço.
Aqui o exponho para merecida evidência, nele simbolizando a minha saudação à Primavera.

Foto: - Folhado (Viburnum tinus L.)

César Brandão - 25.03.2007


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quinta-feira, fevereiro 08, 2007

REFERENDO - poema para o "Não"

Recebi hoje o poema que passo a transcrever:

ERA TÃO PEQUENO

Era tão pequeno
que ninguém o via.
Dormia sereno,
enquanto crescia.
Sem falar, pedia
– porque era semente –
ver a luz do dia
como toda a gente.
Não tinha usurpado
a sua morada.
Não tinha pecado.
Não fizera nada.

Foi sacrificado
enquanto dormia.
Esterilizado
com toda a mestria.
Antes que a tivesse,
taparam-lhe a boca
– tratado, parece,
qual bicho na toca.

Não soltou vagido.
Não teve amanhã.
Não ouviu: "– Querido..."
Não disse: "– Mamã..."

Não sentiu um beijo.
Nunca andou ao colo.
Nunca teve o ensejo de pisar o solo,
pezinho descalço,
andar hesitante,
sorrindo no encalço
do abraço distante.

Nunca foi à escola
de sacola ao ombro,
nem olhou estrelas
com olhos de assombro.

Crianças iguais
à que ele seria,
não brincou com elas
nem soube que havia.

Não roubou maçãs,
não ouviu os grilos,
não apanhou rãs
nos charcos tranquilos.

Nunca teve um cão,
vadio que fosse,
a lamber-lhe a mão,
à espera do doce.

Não soube que há rios
e ventos e espaços.
E Invernos e estios.
E mares e sargaços,
e flores e poentes.
E peixes e feras
as hoje viventes
e as de antigas eras.

Não soube do mundo
Não viu a magia.

Num breve segundo,
foi neutralizado
com toda a mestria:
Com as alvas batas, máscaras de Entrudo, técnicas exactas,
mãos de especialistas negaram -lhe tudo
(o destino inteiro...)

- porque os "abortistas" nasceram primeiro.


Numa sociedade cada vez mais pródiga no confronto de valores e de referências sinto uma crescente dificuldade em atingir a margem do denominador comum - se é que tal existe e não seja já uma utopia.
Entretanto, tendo presente o domínio abordado pelo poema, pese os flavos discursos dos imperadores de todas as razões, a consciência impõe-me uma só verdade: - o direito à vida não se referenda!
Assim colocado, considerando pois o próximo referendo sobre a despenalização da "interrupção voluntária da gravidez", confrange-me que o exercício do dever cívico de votar seja determinado para mais ou menos alínea legislativa, passível de conflitualidade com a essência primordial em que jamais reivindiquei tutela douta e, pior ainda, sujeito a pergunta que não legitimei ninguém a fazer-me.
Perante tal afrontamento, o não é obviamente inequívoco.

César Brandão - 08.02.2007
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